Um movimento democrático gaúcho chamado greve
Sandro R. Cossetin
Professor
Os
movimentos democráticos, em especial as greves, são frequentemente
identificados como paralisantes, inconvenientes e antissociais. Não podiam ser
diferentes. São movimentos que, na sua essência, pressupõem um embate com o
poder. Na política, a reivindicação do cidadão é sempre uma pedra no sapato do
gestor público. Pedra que ele sabe que vai estar no sapato que vai calçar ao
assumir o cargo, mas sempre quer fazer de conta que essa possibilidade não há.
Na condição de situação é um problema, na condição de oposição é uma solução.
Obviamente
que, quando o assunto é a negociação acerca da reinvindicação, é mais fácil
calar e muito cômodo argumentar alegando falta de entendimento, orçamento
restrito, problema herdado dos antecessores... Sempre foi assim: “aceitamos
sugestões”; “vivemos em uma democracia”. Desculpas esfarrapadas (velhas
conhecidas!) e responsabilidades não assumidas.
Também
é triste ver quando a classe que historicamente sofre com o descaso dos
gestores públicos se encaminha para o conformismo diante da ação de forças
políticas que pretendem privatizar o que podem.
A nível
estadual, recentemente uma proposta foi apresentada pelo atual governo
defendendo que a gestão de alguns entes públicos estaduais deve ser delegada à
organizações sociais. No meu entender, uma afronta à sociedade. A proposição
envolve algumas atividades de responsabilidade constitucionalmente pública do
executivo, mas, curiosamente, não envolve o legislativo e o judiciário. Tal
proposta consta no PL 44/2016 e seria cômica se não fosse trágica.
Um
projeto reducionista e sem qualquer perspectiva quanto a proporcionar melhorias
à sociedade gaúcha. Proposições que demonstram a incompetência da presente
gestão, entregado recursos públicos a outrem. Uma proposta contraditória, pois
faz a gestão dos três poderes que recebem recursos do mesmo cofre, mas mantém
dois intocáveis. A distinção entre as atividades, os orçamentos e o
reconhecimento são notáveis.
Às vésperas do dia 15 de outubro de cada ano, o discurso
predominante e conveniente ressurge: “graças a minha professora, hoje eu sei
ler e escrever; graças aos meus professores, eu cheguei aonde cheguei”. Os
educadores sofreriam menos se nunca tivessem escutado tais demagogias, pois o
reconhecimento legítimo que esperam nunca se revela nas ações dos demagogos –
hoje gestores – que as expressam.
Um contexto lamentável, pois “Liberdade, Igualdade,
Humanidade” parece não fazer mais parte da bandeira gaúcha. Principalmente pelo
“prenúncio de mau tempo” quando se reporta ironicamente à remuneração mínima de
uma determinada classe de profissionais: “quer piso, eu vou na T....”
(https://www.youtube.com/watch?v=1Y0TuC25YCA).
Já ouvimos isso antes: manifestações em prol de melhores
condições de trabalho, não só na educação, mas também, na segurança, na saúde,
são sempre vistas como anarquistas, rebeldes e oposicionistas. Como dizem os
mais antigos: “dependendo do lado do balcão que se está, tal preço pode ser
justo ou não”.
Assim, nos deparamos diante de tentativas de diminuir os
cidadãos a meros fantoches. Nessas ocasiões, parece não ser mais necessário
cantar: “Mas não basta pra ser livre, ser forte, aguerrido e bravo; povo que
não tem virtude acaba por ser escravo”. Afinal, na condição de escravo, não é
mais necessário ter educação, saúde, segurança, cultura, lazer... desconfio que
até mesmo viver.